quinta-feira, 13 de novembro de 2025

O Abuso Seletivo do Olhar Jornalístico

A crônica, dizem, é o olhar do autor sobre o miúdo, o diário. Mas e quando o miúdo é o sangue da calçada, e o diário é a repetição do luto? A polêmica da vez, que não é nova, volta à roda: a tal "neutralidade" do Jornalismo de Segurança. Lá vem o jornalista, cheio de esmero, defender a função de "contrapoder", o nobre ofício de fiscalizar a ação policial, citando a ADPF 635 e os protocolos. Tudo muito técnico, correto, engessado. Mas o leitor, o cidadão de bem ou o habitante da área de risco, tem outra calculadora na cabeça, e é aí que a crônica do povo se choca com a manchete do jornal. A primeira coisa que salta aos olhos é a falácia da proporcionalidade. Gasta-se o latim e o megabyte para destrinchar o laudo, a câmera, a legalidade do tiro que abateu aquele criminoso. Um esmiuçamento obsessivo do "suposto abuso" policial. Justo? Talvez. Mas, na mesma proporção, onde está a mesma lupa investigativa e o tempo de tela dedicados a expor o nome, o rosto e a punição efetiva dos que cometeram os crimes de alta letalidade contra a sociedade? O cidadão tem a sensação amarga de que a exigência de laudo perfeito para a polícia é inversamente proporcional à exigência de que o sistema de justiça penal de fato prenda e mantenha preso quem aterroriza. A prioridade, então, não parece ser a segurança pública, mas sim dificultar o trabalho de quem está na linha de frente. E o contexto, onde fica? As grandes operações, as chamadas "megaoperações", não surgem do nada. São a resposta, por vezes desastrosa, a uma violência criminal que virou doença crônica em certas áreas. Ao focar apenas no "remédio" (a ação policial) e omitir a brutalidade da "doença" (a ameaça constante do crime organizado), o questionamento da imprensa parece desproporcional, quase um luxo teórico. O efeito prático é corrosivo. A insistência em dissecar o erro, em humanizar o criminoso abatido com pinceladas de sua biografia, enquanto o agente policial é exposto ao linchamento midiático e à insegurança jurídica constante, resulta na desmoralização da força policial. Cria-se um ambiente onde o policial pensa duas vezes antes de agir sob estresse, e o crime organizado agradece, observando a desordem da legalidade. A linha que separa o jornalismo da advocacia, nesse caso, fica tênue. O foco excessivo nos direitos humanos e na legalidade da ação, pautas típicas de ativistas e advogados, faz o público questionar: o jornalismo está a favor do estado de direito ou apenas de uma parte dele? Para a parcela crítica, o estado de direito é, antes de tudo, a capacidade do Estado de exercer o monopólio da força para garantir a ordem e proteger a vida. Ao se concentrar quase que exclusivamente no controle da violência estatal, a imprensa é vista como negligenciando o direito fundamental à segurança do cidadão comum. Essa é a inversão de valores na narrativa. Quando se critica o "sucesso tático" de uma operação pelas mortes que resultaram (as 121, no exemplo), sem apontar uma alternativa prática e eficaz para confrontar a ameaça, parece que a imprensa não está condenando o erro, mas sim a única força disposta a confrontar. No fim, a crítica não nega o papel fiscalizador. Ela apenas grita sobre a frequência e a proporção. Quando o foco seletivo no "abuso" da farda ofusca a brutalidade do crime organizado, o resultado não é neutralidade, é a percepção clara de que a imprensa se tornou, na prática, um obstáculo implícito à segurança. E isso, meu caro, é uma desconfiança que se vê todo dia nas esquinas do país.

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